Decidi uma coisa: vou falar sobre transformação digital. Tem um tempo que tenho escutado que esse tema já está ultrapassado e que já é bem conhecido das empresas e que talvez não seja mais tão relevante continuar a escrever sobre, mas a verdade é que não é bem assim. É claro que as empresas não precisam mais de artigos extensos explicando o que é a transformação em si, mas fato é que, depois de andar por aí e conversar com diversas organizações em seguimentos variados, o que tenho encontrado são tímidas ações de digitalização intituladas como tal, mas sem avanços de real impacto aos negócios.
Momentum da Transformação Digital
A Transformação Digital é uma jornada longa que conta com alguns estágios importantes como: 1) adoção da tecnologia, 2) tecnologia como parte do negócio, 3) TD como estratégia da empresa, 4) rompimento do modelo tradicional de negócios e 5) inovação digital. Ou seja, procurar seguir as principais tendências com velocidade não é suficiente! A prova disso é a constatação de que, mesmo em setores altamente digitalizados, a maturidade digital pode variar significativamente de forma a impactar os resultados das empresas. Um estudo conduzido pela McKinsey com 164 empresas mostra que líderes em maturidade digital no mundo apresentam desempenho superior com taxa de crescimento de EBITDA até 5 vezes maior em comparação às demais empresas.
Atualmente, as empresas que já deram os seus primeiros passos nessa jornada, estão vivendo o que chamamos de segunda onda da transformação digital, que tem uma visão mais estratégica e focada em metas e objetivos de negócio. Em outras palavras, além de incorporar tecnologias e digitalizar o negócio, é essencial que esse uso seja direcionado de maneira correta e planejada, com o objetivo de otimizar atividades, melhorar o desempenho e aumentar a produtividade.
No Brasil
Embora o Brasil seja reconhecido como um crescente polo de tecnologia, alguns argumentam que a Transformação Digital foi impulsionada por uma combinação da urgência de mudança causada pela pandemia da Covid-19 e porque consumidores e empresas começaram a experimentar soluções que nunca tinham visto antes, pressionando os negócios a fazer mais – e diferente.
A análise da McKinsey nessa mesma pesquisa, mostra que a transformação digital nas empresas brasileiras é um processo bastante desafiador, pois algumas dessas empresas focam em apenas um aspecto e ainda há muita dúvida sobre como, de fato, mudar. O investimento ainda está em práticas isoladas.
Nessa pesquisa as empresas foram categorizadas em quatro grupos de desempenho de acordo com seu grau de maturidade nas dimensões e práticas avaliadas:
- Líderes digitais com pontuação acima de 51 na escala A&DQ;
- Ascendentes com pontuação acima de 35, mas inferior à das líderes digitais;
- Emergentes com pontuação acima de 25, mas inferior às ascendentes;
- Iniciantes com pontuação abaixo de 25.
A pontuação média das empresas foi de 39 pontos na metodologia utilizada, enquanto a pontuação média das empresas líderes foi de 66 pontos, semelhante à de líderes globais com 67 pontos. As dimensões apresentam pontuações semelhantes, exceto em Capacidades que é a dimensão com maior defasagem.
Olhando para a pontuação média das empresas no Brasil contra as empresas líderes identificamos oportunidade significativa para aproximar a maturidade digital em todas as dimensões consideradas.
Principais desafios
Grande parte das empresas pesquisadas enfrentam desafios semelhantes em quatro práticas da transformação digital. Algumas dessas práticas são desafiadoras mesmo para os líderes digitais, indicando que há espaço para alcançar um destaque ainda maior.
- Roadmap de iniciativas: A prática de ter um roteiro específico de iniciativas, que seja ambicioso, priorizado e alinhado em diferentes níveis da empresa, servindo como base para a estratégia de digital e analytics, é bem executada por apenas 10% das empresas.
- Dados e analytics: Apenas 12% das empresas conseguem capturar e integrar dados e análises de maneira estruturada através de uma infraestrutura robusta, como as Plataformas de Dados do Cliente (CDPs), Plataformas de Gerenciamento de Dados (DMPs) e otimizadores integrados com data lakes. Esses recursos fornecem uma visão completa do cliente e são utilizados para apoiar a tomada de decisões em todas as áreas da empresa de maneira regular.
- Talentos: Apenas 8% das empresas conseguem identificar, capacitar e reter talentos em quantidade suficiente que estejam preparados para um modelo de negócio mais digital e analítico.
- Mentalidade baseada em dados: Apenas 13% das empresas adotam uma mentalidade baseada em dados, desenvolvendo uma cultura rigorosa de tomada de decisões objetivas em nível estratégico, tático e operacional em todas as áreas de negócio
Projeções
Considerando o atual cenário de maturidade digital, as projeções futuras para a transformação digital nas empresas brasileiras incluem:
- Alinhamento Corporativo: Mais do que integrar tecnologias aos processos, é crucial alinhar os colaboradores aos objetivos da empresa. A meta é incorporar uma estratégia digital em todo o processo de execução e na cultura organizacional do negócio.
- Foco nas Pessoas: O investimento em líderes e colaboradores será cada vez mais intenso. O engajamento entre esses dois níveis hierárquicos da empresa é fundamental para que a transformação digital possa ser implementada de forma mais natural e com menos impacto negativo.
- Cultura de Inovação: As empresas tendem a investir cada vez mais em uma política de inovação. A cultura de inovação entende que é necessário estar sempre se reinventando e que investir em tecnologias isoladas não é mais uma opção inteligente.
- Processos Inteligentes: A segunda fase da transformação digital exige uma visão mais ampla sobre os processos para evitar que o negócio fique estagnado. A automatização de processos internos deve ser reestruturada, tornando-se mais inteligente e focada em objetivos específicos.
A Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) e de Tecnologias Digitais – Brasscom, prevê que as tecnologias relacionadas à transformação digital, mobilidade e conectividade trarão R$ 845 bilhões em investimentos para o país entre 2021 e 2024.
A computação em nuvem é vista como a principal alavanca desses investimentos, com um crescimento estimado de 20% ao ano e investimentos específicos estimados em R$ 181,9 bilhões nesse período. Outros vetores de investimento incluem Big Data (R$ 77,2 bilhões), Internet das Coisas (R$ 74,3 bilhões), Robótica (R$ 31,4 bilhões), Segurança da Informação (R$ 16,2 bilhões), Redes Sociais (R$ 14,1 bilhões), Inteligência Artificial (R$ 11,5 bilhões), Blockchain (R$ 3,8 bilhões), Realidade Virtual (R$ 2,2 bilhões) e Impressão 3D (R$ 0,7 bilhão).
Além disso, a Estratégia Brasileira para a Transformação Digital (E-Digital) prevê ações e iniciativas para promover a digitalização no país até 2026. Ainda segundo a E-Digital, a transformação digital é um investimento acessível e quase obrigatório para quem quer ter um negócio competitivo nos próximos anos.
Há muito o que se falar sobre transformação digital
A transformação digital é um processo contínuo e desafiador que exige uma visão estratégica, uma cultura de inovação, um foco nas pessoas e uma adoção inteligente de tecnologias. O Brasil tem um grande potencial para se tornar um líder nesse cenário, mas precisa superar alguns obstáculos e acelerar o seu ritmo de mudança. As empresas que conseguirem se adaptar e se diferenciar nessa jornada terão mais chances de se destacar no mercado e gerar valor para os seus clientes, colaboradores e acionistas.
Segundo o Relatório de Transformação Digital da Samba Tech com 100 empresas entrevistadas, 87,5% delas já realizaram alguma iniciativa voltada à transformação, mas 97,5% delas confessam apresentar barreiras para avançar em seus processos de digitalização. Portanto, há sim muito o que se falar e muito a se fazer quando o tema é transformação digital em nosso país. A boa notícia é que as empresas já compreenderam a importância do tema para a sobrevivência de seus negócios.
Artigo originalmente publicado no site tiagoscala.com.